sexta-feira, 20 de maio de 2011

Circuito biológico de luz é desvendado por brasileiros
Com informações da Agência Fapesp - 20/05/2011
Circuito biológico de luz é desvendado por brasileiros
Pesquisadores brasileiros descobriram um "interruptor" que pode fazer com que algumas enzimas de interesse biomédico e biotecnológico emitam luz.[Imagem: Biolum/UFScar]
Circuito com interruptor

"É como se a enzima protoluciferase fosse um circuito eletrônico, que tem uma bateria, representada pelo oxigênio, e uma lâmpada, que é a luciferina."
É assim que o professor Vadim Viviani, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), explica os últimos resultados das pesquisas de seu grupo com materiais bioluminescentes - materiais biológicos capazes de emitir luz.
"Descobrimos agora um dos principais interruptores presentes na estrutura [dessas enzimas], que é responsável por ligar a bateria à lâmpada. Ou seja, fazer com que a reação da luciferina e do oxigênio ocorra, acendendo a luz," completa.
Este é um passo importante para o uso prático dessas enzimas emissoras de luz, que têm interesse biomédico, biotecnológico e ambiental.
A bioluminescência é a produção e emissão de luz por um organismo vivo, através de uma reação na qual energia química é transformada em energia luminosa.
A propriedade é importante para estudar doenças como o câncer ou infecções bacterianas, por exemplo, e também já foi utilizada na detecção de metais pesados no meio ambiente e até em circuitos integrados bacterianos.
Acendendo enzimas
Os cientistas brasileiros descobriram um dos principais "disjuntores" presentes na "caixa de força" de enzimas com baixa capacidade de luminescência.
Essas enzimas pertencem à mesma classe das luciferases - responsáveis pela emissão de luz fria e visível em vagalumes. E elas podem ser modificadas geneticamente para aumentar sua potência, ou seja a intensidade de sua luz.
Em 2009, o mesmo grupo clonou e isolou da larva de um inseto não luminescente - um besouro - uma enzima da mesma família das luciferases (a AMP-CoA-ligases), fracamente luminescente e conhecida como protoluciferase.
Eles queriam descobrir como as luciferases dos vagalumes desenvolveram a capacidade de catalisar a reação de oxidação da luciferina - o composto responsável pela bioluminescência de insetos - e produzir sua luz visível intensa.
Nos últimos anos, ao comparar as sequências de aminoácidos da protoluciferase com a luciferase, os pesquisadores começaram a identificar partes da estrutura que poderiam estar envolvidas com a determinação da atividade de produzir luz.
Por meio de técnicas de engenharia genética, Rogilene Prado, membro da equipe, realizou mutações de aminoácidos da protoluciferase.
Amplificando a bioluminescência
Agora, o grupo identificou que a mutação de um desses aminoácidos aumenta bastante a atividade luminescente da enzima, tornando-a muito semelhante à de uma luciferase.
Isso abre a possibilidade de tornar bioluminescentes outras enzimas da mesma família, que não emitem luz naturalmente, mas que são de grande interesse tecnológico.

Circuito biológico de luz é desvendado por brasileiros
A bioluminescência é a produção e emissão de luz por um organismo vivo, através de uma reação na qual energia química é transformada em energia luminosa. [Imagem: Prado et al./PPS]
Presentes em todos os organismos - das bactérias ao homem - as AMP-CoA-ligases desempenham as mais variadas funções metabólicas, como a biossíntese de pigmentos (em plantas), o metabolismo de lipídeos, a síntese de antibióticos e a eliminação de substâncias tóxicas e compostos químicos estranhos a um organismo ou sistema biológico (xenobióticos).
Em comum, a primeira reação que elas catalisam é a ativação de ácidos orgânicos, como os aminoácidos, ácidos graxos. Ou, no caso do vagalume, a luciferina, que é oxidada pelas luciferases, produzindo luz.
Em função disso, os pesquisadores pretendem utilizá-las como indicadores de determinados ácidos orgânicos de interesse biomédico, como os ácidos tóxicos, e biotecnológicos.
"A capacidade de servir como um indicador para selecionar determinados ácidos orgânicos de interesse farmacêutico e biotecnológico talvez represente o maior potencial de aplicações dessas enzimas", disse Viviani.
Circuito biológico de luz é desvendado por brasileiros
A pesquisa abre caminho para tornar luminescentes enzimas que não emitem luz naturalmente, ou amplificar emissões mais fracas. [Imagem: Biota-Biolum]
Reagentes analíticos
Segundo o pesquisador, algumas luciferases de vagalumes norte-americanos, europeus e japoneses já são utilizadas como reagentes analíticos. Elas são usadas para detectar o estado metabólico de uma amostra biológica e biomarcadores de expressão gênica, ou para marcar células de câncer em estudos biofotônicos, por exemplo.
Por meio das pesquisas com o protótipo da enzima luciferase que clonaram e aumentaram a luminescência, os pesquisadores brasileiros pretendem criar por engenharia genética uma nova enzima luciferase que tenha a propriedade de emitir luz comparável às luciferases empregadas atualmente no mercado.
"Com as condições ideais de evolução, essa protoluciferase poderá se transformar em uma luciferase. Estamos simulando a evolução dela em laboratório", disse Vanini.
O grupo de pesquisa da UFSCar é um dos únicos dedicados ao estudo de enzimas luciferases no Brasil. No Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) há um outro grupo, coordenado pelo professor Cassius Stevani, com o qual eles colaboram, que estuda fungos luminescentes.
Em termos mundiais, segundo Viviani, nenhum grupo conseguiu clonar uma enzima protoluminescente com a capacidade de emitir luz semelhante à do grupo brasileiro.
Bibliografia:

Structural evolution of luciferase activity in Zophobas mealworm AMP/CoA-ligase (protoluciferase) through site-directed mutagenesis of the luciferin binding site
R. A. Prado, J. A. Barbosa, Y. Ohmiya, V. R. Viviani
Photochemical & Photobiological Sciences
19 Apr 2011
Vol.: First published on the web
DOI: 10.1039/C0PP00392A

Sinapse eletrônica revela seus segredos

Redação do Site Inovação Tecnológica - 20/05/2011
Memristor: Sinapse eletrônica revela seus segredos
A análise revelou dados inéditos sobre os fenômenos físicos e químicos que ocorrem enquanto o memristor funciona. O esquema do componente é mostrada no alto da ilustração. [Imagem: Strachan et al.]
Se os cientistas sabem ou não realmente como uma sinapse funciona no cérebro humano, isso não vai fazer com que os cérebros parem de funcionar.
Mas se eles não souberem exatamente como uma "sinapse eletrônica" funciona, eles jamais conseguirão construir os tão sonhados cérebros artificiais.
Sinapse eletrônica
Foi por isso que cientistas da Universidade da Califórnia e da empresa Hewlett Packard se debruçaram sobre o funcionamento de um componente eletrônico revolucionário que, segundo alguns acreditam, é capaz de imitar o funcionamento das sinapses biológicas.
O componente - também chamado de sinapse eletrônica - é o memristor, uma espécie de elo perdido da eletrônica, um componente com um comportamento similar ao do resistor, mas capaz de "lembrar seu passado", o que significa que ele funciona como uma memória não-volátil.
Daí o nome memristor, uma junção de memória e resistor.
A existência desse quarto componente eletrônico fundamental só foi confirmada em 2008.
Funcionamento do memristor
Agora, os cientistas usaram feixes de raios X altamente focalizados para localizar e "fotografar" o canal de aproximadamente 100 nanômetros onde ocorre a inversão da resistência elétrica que marca o funcionamento do componente.
A análise revelou dados inéditos sobre os fenômenos físicos e químicos que ocorrem enquanto o componente funciona.
Esses dados, que mostram como a temperatura do componente varia conforme sua resistência se altera, vão agora alimentar um modelo matemático sobre como o memristor funciona, permitindo que os pesquisadores projetem seus tão-sonhados circuitos que aprendem.
"Um dos maiores desafios para usar esses componentes é entender como eles funcionam: a situação microscópica pela qual eles passam conforme sofrem essa tremenda reversão na resistência," diz o Dr. John Paul Strachan.
Ciborgues e cia
O perfil termal produzido pelas imagens de raios X mostra que o fenômeno a memresistência é fortemente localizado ao redor do ponto de contato que forma o componente - reforçando a similaridade com a sinapse biológica.
Imitar as sinapses biológicas - as junções entre os neurônios - pode permitir a criação de tecnologias totalmente novas, sobretudo na área da robótica, da inteligência artificial estruturada em hardware e de circuitos capazes de aprender conforme executam cálculos repetidamente.
Isso será possível, acreditam os pesquisadores, pela capacidade que os memristores têm de "lembrar" a corrente elétrica que os atravessa.
Bibliografia:

The switching location of a bipolar memristor: chemical, thermal and structural mapping
John Paul Strachan, Dmitri B Strukov, Julien Borghetti, J Joshua Yang, Gilberto Medeiros-Ribeiro, R Stanley Williams
Nanotechnology
16 May 2011
Vol.: 22 (2011) 254015 (6pp)
DOI: 10.1088/0957-4484/22/25/254015

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Eletromecânica também funciona em nanoescala

Redação do Site Inovação Tecnológica - 19/05/2011
Eletromecânica também funciona em nanoescala
Um nanotubo de carbono vibra como uma corda de violão. Essas oscilações influenciam as propriedades do sistema se um campo magnético (H) for usado para acoplar o movimento mecânico do nanotubo com a corrente elétrica que passa através dele.[Imagem: Gustav Sonne/University of Gothenburg]

Físicos da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, demonstraram que os princípios eletromecânicos - largamente explorados em equipamentos à nossa volta - são igualmente válidos em escala nanométrica.
Isto vai permitir a miniaturização ainda maior de dispositivos como os acelerômetros que acionam os airbags de automóveis ou os giroscópios, que já equipam até alguns telefones celulares, entre várias outras possibilidade
Mas, principalmente, vai permitir a  incorporação de nanoestruturas - como os nanotubos de carbono, os nanofios ou mesmo as folhas de grafeno - em dispositivos que poderão ser controlados ou controlar equipamentos eletrônicos de uso diário.
Mecânica quântica e mecânica clássica
Embutidos no conforto do nosso dia-a-dia, já usamos uma série de componentes microeletromecânicos - os chamados MEMS - na forma de bússolas, acelerômetros, sensores e diversos outros.
A descoberta agora abre caminho para os NEMS (NanoElectroMechanical Systems: sistemas nanoeletromecânicos).
O que todos esses minúsculos aparelhos têm em comum é que eles combinam propriedades mecânicas e eletrônicas, a fim de reagir a estímulos externos.
A descoberta dos pesquisadores suecos não apenas abre a possibilidade de que esses equipamentos sejam reduzidos à dimensão nanométrica, como também garante que as propriedades dos materiais em nanoescala, governados pelas leis da mecânica quântica, sejam diretamente exploradas por aparelhos em escala macro, governados pelas leis da mecânica clássica.
Eletromecânica também funciona em nanoescala
Materiais em nanoescala, governados pelas leis da mecânica quântica, poderão ser diretamente acoplados a aparelhos em escala macro, governados pelas leis da mecânica clássica. [Imagem: Gustav Sonne]
Usos imediatos e futuristas
Essas máquinas nanométricasviabilizarão a construção de sensores capazes de fazer medições com uma sensibilidade sem precedentes - por exemplo, nano-osciladores ultra-sensíveis, capazes de detectar massas até mesmo de moléculas ou átomos individuais.
Isso pode ser altamente interessante para o mapeamento dos spins dos elétrons e dos núcleos atômicos, o que, por sua vez, pode ser usado em aparelhos de ressonância magnética com uma resolução sem precedentes, na substituição da eletrônica pela spintrônica ou em computadores quânticos.
Nano-oscilador
A razão pela qual esses sistemas em nanoescala são tão sensíveis a estímulos externos advém basicamente das suas dimensões diminutas.
Normalmente, a frequência com que um ressonador mecânico oscila varia inversamente com as suas dimensões. Ou seja, diminuindo o tamanho do oscilador implica em aumentar a frequência mecânica.
Ao passar da dimensão dos MEMS (micro) para a dimensão dos NEMS (nano) é possível atingir frequências de até 10 GHz, o que gera respostas muito rápidas a forças externas.
Os pesquisadores usaram nanotubos de carbono em seus experimentos, demonstrando a sua possibilidade de combinar com a física clássica as propriedades únicas dessas nanoestruturas.
Bibliografia:

Mesoscopic phenomena in the electromechanics of suspended nanowires
Gustav Sonne
May 2011
http://gup.ub.gu.se/gup/record/index.xsql?pubid=139172



quarta-feira, 18 de maio de 2011

Nanolaser sólido ajudará internet a economizar energia

Redação do Site Inovação Tecnológica - 18/05/2011
Nanolaser sólido ajudará internet a economizar energia
Em cima, diagrama mostrando o fluxo de corrente na cavidade (setas azuis) e a fuga de corrente através dos espelhos do cristal fotônico (setas amarelas). Embaixo, o mapa da fuga de corrente dentro do dispositivo.[Imagem: Ellis et al./Nature Photonics]
Em 2005, duas pesquisadoras criaram um novo tipo de laser para telecomunicações mais rápido e mais eficiente.
Mas o que era rápido e eficiente para os padrões de seis anos atrás não vale mais para hoje - os lasers são essenciais na transmissão dos dados digitais que estão na base do funcionamento de toda a internet.
Felizmente, a Dra. Jelena Vuckovic não abandonou a área, e acaba de apresentar um upgrade significativo para o seu nanolaser.
Laser de cristal fotônico
Jelena e sua equipe trabalham com um tipo de laser chamado laser de cristal fotônico, um laser particularmente promissor não apenas pela sua alta velocidade e dimensões minúsculas, mas principalmente porque ele opera em limites de emissão que não consomem muita energia.
"Nós fabricamos um transmissor óptico de dados em nanoescala, um laser que usa 1.000 vezes menos energia e é 10 vezes mais rápido do que as melhores tecnologias comercialmente disponíveis hoje," diz ela.
"Melhor ainda, nós acreditamos que podemos melhorar esses números," acrescenta.
Laser com bombeamento elétrico
Já existem lasers com baixos limites de emissão, mas eles exigem um segundo laser para injetar a energia que precisam - um fenômeno conhecido como bombeamento.
"Nós realmente precisamos de um laser bombeado com eletricidade, não com luz," diz Jelena. Estes também já foram feitos, mas são ineficientes e não conseguiram atingir a escala comercial.
Agora, pela primeira vez, os pesquisadores criaram um laser com bombeamento elétrico que é fácil de fabricar e de fato consome muito pouca energia.
Nanolaser
O nanolaser é formado por um sanduíche de camadas de dois materiais semicondutores - arseneto de gálio e arseneto de índio - cada uma delas construída por um "canhão" que lança um spray preciso de moléculas.
O sanduíche mede meros 220 nanômetros de espessura - seria preciso empilhar 1.000 deles para atingir a espessura de uma folha de papel.
Depois de pronta, se a pastilha for seccionada, pode-ser ver que o arseneto de índio forma pequenos "montes" - uma estrutura conhecida como pontos quânticos.
Depois de doparem duas regiões específicas com íons de silício e de berílio, para criar o emissor e o receptor do laser, os pesquisadores perfuram a pastilha, criando uma malha cuidadosamente espaçada de furos.
Se os furos forem muito grandes ou pequenos demais, ou se não ficarem no espaçamento correto, o laser não funciona. Isso porque os furos funcionam como uma sala de espelhos, onde a luz ricocheteia de volta para o centro do laser.
Luz no horizonte
Nesta sala de espelhos do nanolaser, os fótons são concentrados e amplificados até formarem o feixe de laser, que pode ser modulado até 100 bilhões de vezes por segundo - 10 vezes mais do que os melhores transmissores ópticos usados hoje.
É essa combinação de "emissão" e "não-emissão" que forma os dados binários - luz ligada representa um 1 e luz desligada representa um 0.
Mas nem tudo está pronto: o nanolaser opera apenas a 150 Kelvin, frio demais para uso prático.
"Com melhorias no processamento," garante Jelena, "nós poderemos construir um laser que opere a temperatura ambiente e mantenha a eficiência energética em torno de 1.000 vezes menos do que as tecnologias atuais. Nós podemos ver a luz no horizonte."
Bibliografia:

Ultralow-threshold electrically pumped quantum-dot photonic-crystal nanocavity laser
Bryan Ellis, Marie A. Mayer, Gary Shambat, Tomas Sarmiento, James Harris, Eugene E. Haller, Jelena Vuckovic
Nature Photonics
Vol.: 5, pages: 297-300 (2011)
DOI: 10.1038/nphoton.2011.51

terça-feira, 17 de maio de 2011

16/05/2011 12h04 - Atualizado em 16/05/2011 12h04

Cientistas descobrem relação entre depressão e DNA

Resultados semelhantes foram obtidos por dois estudos diferentes.
Pesquisadores ainda não conseguiram identificar um gene específico.

Do G1, em São Paulo
Dois estudos distintos chegaram ao mesmo resultado na busca por uma explicação genética para a depressão. Segundo os pesquisadores, o DNA do cromossomo 3 está ligado ao mal. Contudo, eles não conseguiram isolar nenhum gene específico que cause o problema, que afeta cerca de um quinto das pessoas em algum momento da vida.
Os estudos foram feitos separadamente pela Universidade Washington, em Saint Louis, EUA, e pelo King’s College, em Londres, Inglaterra. Os resultados de ambas foram publicadas pelo “American Journal of Psychiatry”.
“O que é impressionante é que os dois grupos encontraram exatamente a mesma região em dois estudos separados”, disse Pamela Madden, da instituição norte-americana. “Estávamos trabalhando independentemente, sem nenhum tipo de colaboração, e quando procuramos uma forma de replicar nossas descobertas, a equipe de Londres entrou em contato e disse: ‘Encontramos a mesma ligação, e isso é significativo’”.
“Pela primeira vez, encontramos uma região genética associada à depressão, e o que faz as descobertas impactantes é a semelhança entre os resultados dos nossos estudos”, afirmou Gerome Breen, autor principal da pesquisa britânica.
Estudos anteriores feitos com famílias já sugeriam que o risco de depressão fosse determinado pela genética. Os pesquisadores acreditam ainda que haja mais genes envolvidos no processo. As novas descobertas não terão impacto imediato para os pacientes, mas ajuda a compreender melhor o que causa o mal, segundo os cientistas.

segunda-feira, 16 de maio de 2011


Átomos individuais podem nunca ter sido vistos

Agostinho Rosa - 16/05/2011
Átomos individuais podem nunca ter sido vistos
Diversas imagens topográficas do silício, feitas por STM, onde os pontos são apresentados como sendo os átomos do material. [Imagem: Chaika/Myagkov/Journal of Physics]
Microscópios capazes de fazerimagens de átomos, e até imagens de átomos neutros, não são nenhuma novidade, e podem ser comprados no comércio.
O público também já se acostumou com imagens como as do lado, geradas pela varredura dos materiais pelas finíssimas pontas desses microscópios eletrônicos.
Mas agora um grupo de cientistas da Espanha e da República Checa afirma que o que se vê nestas imagens não são os átomos - os pontos brilhantes seriam na verdade o espaço entre os átomos, que sequer aparecem na foto.
Microscópios que fotografam átomos
O nascimento da nanotecnologia está intimamente vinculado ao surgimento dos microscópios capazes de gerar imagens em escala atômica.
Os chamados microscópios eletrônicos de varredura por tunelamento (STM - Scanning Tunnelling Microscope) foram os primeiros a atingir uma resolução suficiente para detectar os átomos.
Ora, se há até microscópios no mercado que prometem fazer imagens de átomos, como pode-se agora dizer que o que eles enxergam não são os átomos?
Assunto delicado
Neste ponto, entra em cena um assunto delicado, daqueles sobre os quais dificilmente se fala em público: a "certeza" sobre as observações científicas.
É um assunto sobre o qual a maioria dos cientistas concorda, mas apenas tacitamente - qualquer referência a ele costuma colocar alguns acadêmicos na defensiva, gerando reações muito tenazes.
Desta forma, é melhor não tocar muito no assunto, que passa ainda mais ao largo das "preocupações" do público, que recebe uma visão mais dogmática do que seria a ciência, suas conclusões, suas provas e suas certezas.
Por exemplo, é comum que os cientistas usem termos como "evidências científicas" - coisas que falariam por si sós, independentemente de qualquer interpretação -, ou "comprovação científica", como algo que encerraria de vez um debate qualquer.
Na verdade, tudo o que a ciência coleta são indícios, e todas as conclusões dos cientistas são interpretações de determinados experimentos, nunca palavras finais. É por isso que você vê tantas vezes a palavra "pode" nas manchetes aqui do Site Inovação Tecnológica - "pode ser" é bastante diferente de "é", por mais que os indícios sugiram que seja.
Felizmente é assim, senão, como já temos teorias para quase tudo, chegaríamos à insensata conclusão de que sabemos tudo - o que seria a morte da própria Ciência enquanto instituição.
Realidade, teorias e modelos
Que não se vá ao extremo oposto, propondo que nada do que a Ciência propõe seja válido ou substancial - por observação direta podemos ver o contrário. Mas não é razoável permanecer em um extremo só pelo risco de cair no outro - destacando mais uma vez que estamos levantando peculiaridades do processo de "comunicação da ciência", não do método científico.
Senão, vejamos: Os experimentos permitem a elaboração de teorias, e as teorias levam à construção de modelos, que são geralmente usados para descrever comportamentos e propriedades ou para prever eventos.
A teoria nunca equivale à realidade, é apenas uma interpretação dela. E o modelo quase nunca consegue abarcar toda a teoria.
Átomos individuais podem nunca ter sido vistos
Por exemplo, a Teoria da Relatividade, adequadamente restringida por várias simplificações úteis, levou ao modelo do Big Bang. Embora a maioria dos cientistas e a imprensa em peso fale do Big Bang como se ele fora um "fato histórico", sua conexão com a realidade é muito tênue - essa conexão é mediada por uma série de pressupostos, conjecturas e simplificações.
Obviamente, modelos e teorias não sobrevivem muito se não tiverem um bom poder explicativo - uma capacidade de explicar os fenômenos observados. Assim, modelos que sobrevivem são muito bons, provavelmente fundamentados em teorias excelentes - é o que acontece com o modelo do Big Bang e com a Teoria da Relatividade.
Mas isto não quer dizer que tais explicações durarão para sempre - de fato, pode-se dizer, com altíssimo índice de probabilidade de acerto, que elas não durarão por muito tempo da forma como estão hoje.
Mitos científicos
No mundo da física clássica, onde maçãs caem, ímãs atraem ferro e combustíveis queimam, a leitura do indício coletado no experimento se aproxima dos sentidos humanos - as leis da termodinâmica estão aí para exemplificar isto. Então, nesse nível, as teorias são propostas com maior nível de "aderência" ao real.
Talvez esteja aí a origem da mitologia das observações inquestionáveis, das conclusões definitivas e, finalmente, da ciência conclusiva e infalível.
Se, nesse nível, tais mitos já são questionáveis, tudo se complica quando o fenômeno a ser estudado se afasta dos sentidos humanos, seja em dimensões, seja em velocidade ou em qualquer outro aspecto.
Nesse caso, o cientista precisa construir equipamentos para fazer os experimentos. Esses equipamentos, contudo, são feitos segundo interpretações da realidade - só se constrói um microscópio para ver átomos depois que se aceita que átomos existem, e só se constrói os sensores capazes de detectar os átomos depois que se elaboraram teorias sobre o que se pode detectar em um átomo, e assim por diante.
Logo, qualquer que seja o resultado do experimento, e as conclusões que se tira dele, esse experimento tem, em sua sequência de execução, uma equivalente sequência de "intermediários", eivados de interpretações.
Nos complicados laboratórios modernos, com seus sensores e medidores ultra-sofisticados, existem várias "camadas" de interpretação, embutidas nas inúmeras peças que compõem esses equipamentos cada vez mais complexos.
É por isso que a usual referência a evidências, provas e certezas, como comumente se lê e se ouve, é algo tão distante da realidade daquilo que os cientistas realmente fazem.
Microscópios que não enxergam átomos
Átomos individuais podem nunca ter sido vistosÉ isto o que agora é ilustrado pelo caso dos microscópios eletrônicos e das imagens que eles geram dos átomos.
Na verdade, mesmo antes do questionamento agora publicado, os cientistas já sabiam que essas imagens não são realmente imagens dos átomos, no sentido que se fala da fotografia de uma bola de gude, por exemplo.
Um microscópio de tunelamento por varredura usa uma minúscula ponta eletrificada, eventualmente com apenas um átomo em sua extremidade, que é passada, a uma pequena distância, sobre toda a extensão da amostra a ser observada.
A imagem é gerada medindo a corrente dos elétrons que tunelam entre a ponta do microscópio e a superfície da amostra.
Assim, o que a imagem mostra seriam, na verdade, variações espaciais na densidade do estado de elétrons da superfície da amostra próximas ao nível de Fermi - o nível de energia dos elétrons mais fracamente mantidos em um sólido.
Contudo, como a densidade dos estados nem sempre é o mais alto quando a ponta está diretamente acima dos átomos, não é possível saber com absoluta certeza se aqueles pontos brilhantes que aparecem nas imagens geradas pelo STM correspondem aos átomos ou ao espaço entre eles.
Primeiros princípios
Nesse caso, pode-se argumentar, que seria simplesmente uma questão se saber se estamos vendo uma imagem dos átomos ou um negativo da imagem dos átomos.
Infelizmente não é tão simples.
Ocorre que as imagens geradas são totalmente diferentes dependendo da estrutura e da composição da ponta do microscópio - no sentido discutido acima, a ponta individualmente representa uma "camada" de interpretação embutida na interpretação mais geral do resultado do experimento, ou seja, da imagem.
Assim, os cientistas precisam conhecer com detalhes e com precisão as forças químicas e físicas presentes e atuantes entre a ponta e a superfície - e lá vai outra camada de interpretação, melindrando quaisquer pretensões de certeza.
O que os cientistas fizeram agora foi tentar partir da situação mais simples possível, realizando os chamados cálculos de primeiros princípios, quando se parte de propriedades mais fundamentais e que podem ser certificadas com maior acurácia - sem nenhuma "certeza", obviamente.
Espaços, e não átomos
Átomos individuais podem nunca ter sido vistos
Usando nanotubos de carbono e grafite, e uma ponta específica de microscópio, os pesquisadores concluíram que os pontos brilhantes que aparecem nas imagens geradas pelo microscópio de varredura por tunelamento correspondem aos espaços vazios entre os átomos, e não aos próprios átomos.
A diferença não é pequena, e pode impactar resultados de inúmeras pesquisas.
Por exemplo, o estudo de defeitos nografeno e em filmes finos, as promissoras interfaces entre materiais, que já são estudadas e exploradas em nível atômico, e até no campo dossemicondutores, cuja miniaturização constante exige que se trabalhe em escalas cada vez menores.
A pergunta que se coloca então é: os átomos individuais já foram de fato "vistos"?
Se esta nova interpretação estiver correta, a resposta é não: os átomos estariam nos espaços vazios entre os pontos brilhantes.
Como eles aparecerão numa futura imagem irá depender da avaliação dos diversos tipos de pontas usadas nos microscópios e dos softwares que traduzem as leituras do sensor em imagens mostradas na tela do computador - pontas que terão que ser refeitas com exigências mais estritas e softwares que terão de ser atualizados.
Outra pergunta a ser respondida é por que os espaços vazios aparecem como pontos.
Ou, outra possibilidade plausível, esperamos até que outra equipe de cientistas encontre falhas na demonstração agora publicada e diga para esquecermos este episódio e que, sim, já estávamos vendo os átomos individuais desde o início.
Bibliografia:

Forces and Currents in Carbon Nanostructures: Are We Imaging Atoms?
Martin Ondrácek, Pablo Pou, Vít Rozsíval, Cesar González, Pavel Jelínek, Rubén Pérez2
Physical Review Letters
Vol.: 106, 176101 (2011)
DOI: 10.1103/PhysRevLett.106.176101